Cresci observando os varais da vizinhança, as donas de casa estendendo ao sol roupas ainda encharcadas de encontro ao vento. Cresci com simplicidade em um lar que exilava amor, afeto e ensinamentos.
Tornei-me um pensador nato, observador e com um olhar cauteloso para aquilo que algumas pessoas não se importavam. Portanto, o tempo passou e levou alguns desses personagens, não sei bem ao certo para onde, mas levou. Também levou meus avós, tias, tios, amigos e não tive tempo de dizer adeus, mas se foram, não porque desejavam, mas porque era o momento.
E lá está o varal, aquele mesmo que passou pelas mãos dos meus antepassados, o mesmo que chegou a estender meus sonhos, meus devaneios. Hoje vejo o varal resistindo o peso do tempo que foi encarado e que ainda enfrenta junto às chuvas, sol, madrugadas geladas e solitárias. Reconheço todos os nossos anseios pendurados a esse destino implacável que embarca as nossas vidas e que não permite emendas.
Observo o varal das nossas almas e todos os sentimentos que deixaremos lá para secar com o brilho do sol escaldante, outros ficaram ao sereno antes que retornem para dentro de nossos lares com a finalidade de causar discórdia em nossos corações.
Enfim, secaram-se as lágrimas, as roupas e o suor de nossos corpos sob esta terra que ainda há de ocultar todos os enigmas que ainda iremos presenciar.