Estava lá.
Eu no meio de tantas pessoas, próximo aos arranha-céus que me tornou pequeno. Um peso insignificante em meio à solidão de pensamentos.
O meu olhar estava abatido, desprezado por mim e tão certo, transparente para aquelas outras pessoas que tiveram os seus olhares direcionados ao meu rosto. Tudo estava tão confuso, atrasado, já é tarde.
Para pensar em corrigir algo, mudar alguma ação, deixar transparecer o ódio para esconder o amor. Talvez seja essa a forma para proteger o coração. As informações armazenadas convulsionam a realidade e brincam de ninar com a fantasia.
Sento-me. No antepenúltimo banco do lado esquerdo do trólebus, olho para a praça em direção aos logotipos, marcas, valores, cores, universos, o vazio. Em todas aquelas pessoas amontoadas, jogadas, concentradas em suas vidas cronometradas, ajustadas. Desajustadas.
Sinto-me. Intrigado, convidado, a percorrer de um lado para o outro, mas sem destino. Os odores multiplicados fazem-me como um cão cego a andar na escuridão. Os gritos, os alertas, as sirenes, a brecada repentina de um carro em velocidade, a turbina de um avião em um vôo rasante. Por favor, me dê um instante.
Meu celular toca. Faz-me retornar a minha órbita urbana, castigada, a poluição não foi também amenizado, o tempo não virou em chuva e pelo contrário, tudo continua seco. Como a simplicidade das coisas, a cor cinza mesclado com os grafites e procuram-se a tonalidade de transparência da alma – resolvo não atender o celular.
Mais uma ligação perdida como eu, mais uma mensagem como a minha sem resposta e outra pessoa como eu do outro lado querendo respostas. O fator preocupação deve incomodar talvez tirar o sono, mas não a sensação de culpa. E, já me falaram um dia sobre a ternura.
Aquela coisa fofa como um urso de pelúcia jogado no meio da cama ou enrolado ao edredom, a verdadeira companheira da bondade que reage tão indiferente se for comparado ao lado da vaidade, e lá está eu observando minha face pelo reflexo do vidro. Alguns pensamentos já se tornaram meu inimigo íntimo, tão próximo que me excita a respirar ofegante.
Mas entenda-me que não há prazer. Não existe uma atração explicável, é como um instinto, como sexo sem amor, uma violação de conduta. A pura intolerância, a prisão ao apego.
Já se passou alguns minutos e olhando atento ao meu pulso vejo que já se foi uma hora, novamente o celular toca, mas não quero atender, não apresentar a minha voz tremula, dizer que estou bem. Sendo que estou apenas… Apenas sem vontade de falar, não irá adiantar, não irão entender, não quero ter que ficar a me explicar e sim, resolvo apenas guardar tudo nessa minha caixa preta e depois quem sabe escrever.
Mas enfim, já sei quem nem todos irão entender ou talvez não vá perder seu valioso tempo em saber o porquê de eu estar lá. Mas já falei que agora é tarde, tudo está tão seco como o meu rosto que deixou uma lágrima cair, um sentimento de amor transparecer.